domingo, 27 de novembro de 2011

Do amor e da sua falta

                    Quando as forças nos faltam e o mundo à nossa volta parece que não encontra o sentido, temos que pensar com os antigos e na simplicidade daquilo que nos legaram.
Hoje escolhi S. Paulo, um fundador do catolicismo, em cujo discurso abundam as afirmações de reprovação do amor sensual, mas tal facto que não o impediu de legar à humanidade um dos mais belos poemas sobre o amor que a seguir transcrevo:

“Ainda que eu fale a língua dos homens e dos anjos,
se não tiver amor sou como o bronze que soa ou um címbalo que retine.
Ainda que eu tenha o dom da profecia e conheça todos os mistérios e toda a ciência, ainda que eu tenha tão grande fé que transporte montanhas, se não tiver amor, nada sou.
Ainda que eu distribua todos os meus bens e entregue o meu corpo para ser queimado,
se não tiver amor de nada me vale.

O amor é paciente,
o amor é prestável,
não é invejoso,
não é arrogante nem orgulhoso,
nada faz de inconveniente,
não procura o seu próprio interesse,
não se irrita nem guarda ressentimento.
não se alegra com a injustiça,
mas rejubila com a verdade.
tudo desculpa, tudo crê,
tudo espera, tudo suporta.

O amor jamais passará.
As profecias terão o seu fim,
o dom das línguas terminará
e a ciência vai ser inútil.
Pois o nosso conhecimento é imperfeito 
e também imperfeita é a nossa profecia.
Mas quando vier o que é perfeito,
o que é imperfeito desaparecerá.
Quando eu era criança,
falava como criança.
Mas, quando me tornei homem,
deixei o que era próprio de criança.

Agora, vemos como num espelho,
de maneira confusa;
depois veremos face a face.
Agora, conheço de modo imperfeito;
depois conhecerei como sou conhecido.
Agora permanecem estas três coisas:
a fé, a esperança e o amor;
mas a maior de todas é o amor”
S. Paulo, ICor, 13, 1-13.

Em conclusão: a vida sem amor não tem sentido e para nada servirá. E o amor, em todas as suas formas é a coisa mais simples de realizar – nas palavras, nos actos e até nas omissões.




segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Do Agostinho em torno do destino do Homem

    

Porque em tempos de crise, espiritual e material, convém ler os antigos, deixo aqui um excerto de um texto assinado por Agostinho da Silva e publicado, em tempos, na íntegra, no Blog Cadernos de Filosofia Extravagante 

 

                               Projecto

Agostinho da Silva

A quem chega, esfomeado de sol que não seja apenas uma entidade de cálculo astronáutico; de mar que não seja somente o das velhas imagens de cinza e chumbo; de céu que não evoque fatalmente todos os pessimismos prognósticos de uma poluição em que a humanidade se suicide; a quem vem de todos os medíocres países humanos cujo ideal mais alto parece ser o de constituírem um mercado comum que, dados os pontos fundamentais em que assenta não será mais do que um supermercado de excesso de produção e de consumo em que o que vale é o dinheiro de que cada um dispõe e não a fome que tem para satisfazer; aos que atravessam os Pirinéus, não com as incomodidades e os desastres de quem, por não ser rei em terra própria, vai ser na alheia escravo, mas com os confortos que mais rápida do que lentamente lhes estão destruindo a alma, pelo pecado mortal de ter sempre mais do que precisam e menos do que desejam; a esses tais, indo-europeus, brancos e pragmáticos, que dominaram o mundo e cujo afã é o de organizarem o trabalho de tal modo que ele os obrigue a trabalhar mais; àqueles que estão inquietos pela existência de nações em que ainda o indivíduo existe, as atraem a seu supermercado e já tentam a Espanha, e em que apesar dos desesperos se espera que volte o Rei Artur ou O de Alcácer; a esses todos oferece Sesimbra sol, céu e mar; que os ilumine, os proteja, os embale..." 

Ou seja, por mais que nos custe aceitar, as coisas boas são aquelas que nos são dadas e o que graciosamente nos é dado deveria ser estimado e apreciado, pois o Ser vale mais que o ter, o contemplar vale mais que o produzir, o desejar vale mais do que o possuir.
De uma maneira simples, o mundo está em crise porque o homem tem vindo a inverter as suas prioridades.   

sobre a verdade

"O melhor de uma verdade é o que dela nunca se chega a saber", escreveu algures Vergílio Ferreira.
E parece que assim é. O próprio Cristo quando interrogado sobre o que era a Verdade, virou o olhar e fixou-o no chão e com este silêncio respondeu ao essencial: o fundamental da Verdade é o que permanece para além dos discursos e das acções.